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Sociedade da transparência, opacidade da intimidade[1]

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Sociedade da transparência, opacidade da intimidade[1]

xxiiijornada 19 de julho de 2018 in Boletim Persiana Indiscreta 0

“Nenhum outro lema domina atualmente tanto o discurso público como a transparência”. Assim começa o breve ensaio do filósofo Byung-Chul Han, intitulado A sociedade da transparência (Berlim, 2012). Suas referências vão de Platão a Heidegger, de Barthes a Foucault, de Freud a Lacan, e abrem um amplo leque de significações do que já se revela como um significante mestre de nossa civilização. O ideal de transparência vai hoje muito além da denúncia da corrupção política e da defesa da liberdade de informação, atingindo cada âmbito do ser que fala para transformar seu universo em “um inferno do igual”, sem alteridade possível. É o ideal transformado em um imperativo de fazer o Outro transparente, de fazer desaparecer a alteridade que se apresenta sempre como opacidade de um gozo, reduzindo-a a uma informação objetiva e transmissível, sem equivocidade possível, reduzindo também assim a dimensão da verdade da palavra à exatidão da cifra.

A experiência analítica mostra que não há, contudo, imperativo do supereu sem o retorno paradoxal daquilo que ele tenta liquidar. O imperativo da transparência alimenta, assim, a opacidade que o gozo faz presente na intimidade de cada ser, que fala tomado na sua singularidade irredutível. A ponto de transformar esse retorno num novo imperativo, não menos paradoxal: gozar da própria transparência sem saber nada sobre a opacidade que a habita! E isso se apresenta em cada um dos registros indicados pelo filósofo:

– Na sociedade chamada “positiva”, cujo instrumento ideal seria uma linguagem sem equívocos, como a linguagem formal da máquina lógica. O retorno da opacidade do gozo toma aqui a forma da falta de ser, do sem sentido que habita na acumulação constante de informação.

– Na exposição sem segredos diante do olhar do Outro, exposição que aniquila a distância do íntimo em um ideal de integração de qualquer alteridade. Mas a falta de distância não é proximidade. A opacidade do gozo requer um “des-distanciar”[2] (termo heideggeriano), de uma distância para alojar sua alteridade.

– Na ideologia de avaliação e de procedimentos baseados em evidências, que deixa na opacidade o objeto de gozo, aquele objeto sublinhado por Lacan na obra freudiana como Das Ding, a Coisa impossível de representar, de fazer evidente. Dela só temos os indícios – e a boa interpretação da famosa evidência com que o cientificismo atual nos esmaga -, os signos que exigem sempre uma interpretação.

– Na extensão da pornografia, da exposição sem véus que reduz a erótica do corpo à obscenidade da carne, apagando da imagem do corpo aquele punctum no qual Barthes colocou o tempo necessário da contemplação e do desejo.

– Na aceleração do tempo de compreender que reduz qualquer relato, qualquer discurso simbólico, a um processo de informação imediata. Exige-se aqui um toque proustiano, além da desaceleração necessária, onde o sujeito não aparece na “fruição do imediato”, senão “muito mais tarde”, no tempo da reminiscência que é o tempo próprio do significante irredutível à unidade de informação.

– Na tirania da intimidade, entendida como transparência psicológica do sujeito ante si mesmo. Trata-se aqui, pelo contrário, de situar a intimidade do gozo como o grau máximo de opacidade do sujeito, ali onde é mais Outro para si mesmo.

– Na sociedade chamada “de informação” que “não gera nenhuma verdade”. Nela, a hiperinformação não lança luz na obscuridade, mas deixa a própria verdade (Aletheia) sem possibilidade de se desvelar.

– Na revelação, que perdeu o valor que teve, por exemplo, na experiência religiosa, reduzida à aquisição de um conhecimento objetivo. Rousseau e Kant são aqui dois testemunhos da instauração do Outro da vigilância e do controle no que se pode ordenar atualmente como dois vértices do discurso pedagógico.

– Na chamada sociedade de “controle”, onde o panóptico único de Bentham foi transformado em uma rede de habitantes que se controlam reciprocamente na era do “panóptico digital”. A suposta transparência converte aqui o sujeito em um objeto de intercâmbio sob a sombra opaca do gozo do Outro, disseminado agora numa ubiquidade virtual.

Em cada um desses registros, a experiência analítica orientada pela bússola lacaniana do real poderá ser-nos útil para recolocar a singularidade do ser que fala nos paradoxos da transparência e da opacidade do gozo.

Palavras-chave: Byung-Chul Han, prazer, opacidade, transparência
Tradução: Luiza Sarno (Associada do IPB-BA)

 


[1] Contribuição para o debate do Fórum de Turim da Escola Lacaniana de Psicanálise (11/10/2014) sobre “Sociedade da transparência, opacidade da intimidade”. Agradeço a Begonya Gasch e Jordi Marimon por me apresentarem ao livro de Han que motivou esta resenha. 16 de agosto de 2014. Texto cedido amavelmente pelo autor para tradução.
[2] “Ent-fernen” em Heidegger, Martin, Ser e tempo. Tradução, Márcia Sá Cavalcante Schuback. 12ª edição. Petrópolis: Vozes, Universidade São Francisco, 2002.
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